Preservar imóveis antigos no Brasil, país jovem que muitos acusam de não ter memória, é uma dificuldade. A lógica do mercado e a especulação muitas vezes falam mais alto, colocando abaixo construções centenárias nas principais cidades do país. Se por um lado isso é triste, por outro existe a possibilidade de preservação com propostas alternativas.
Com originalidade aliada ao bom senso, o arquiteto Lincoln Ferri Amaral desenvolve projetos que oferecem novas alternativas para as construções com menor custo. Uma das marcas de seu trabalho é a fuga do tradicional e a busca pelo inesperado. Assim surgiu a idéia de reaproveitar materiais de demolições em novas construções.
Um dos projetos em andamento, em parceria com o arquiteto Weber Abud, é a “Mansão da Seis”, que apesar de passar imagem de um enorme casarão é um residencial formado por 15 kitchenetes em três tamanhos e disposições diferentes. “A idéia foi fazer uma casa legal, bonita e fugir daquele padrão tradicional das kitchenetes, alinhadas lado a lado em frente um corredor comprido. Minha sugestão deixar o local com ares das antigas vilas”, conta.
A ‘mansão’ está sendo construída em um terreno na rua Carlos Gomes, popularmente conhecida como rua seis. No local existiam duas casas muito antigas e sem condições favoráveis à reformas. Foram demolidas e parte do entulho pôde ser reaproveitado. De acordo com os arquitetos, do material de uma demolição é possível reutilizar portas, janelas, gradis, dormentes, azulejos, tijolos entre outros. Com isso, o custo total da obra chega ficar 30% mais barato. Para a construção das kitchenetes, um dos pontos principais foi o uso de tijolos antigos por meio da técnica do ‘lavado’ , além de todo o material que pode ser reciclado.
O velho com jeito de novo
Mais do que um meio de economizar na construção, utilizar peças de demolição é também um estilo. Para quem gosta, a procura de peças antigas e sua adaptação no projeto é a melhor parte da obra. Para quem visita uma construção feita com material de demolição, o interessante é conhecer a história.
O estilo rústico do Restaurante Degraus foi garantido pelo uso de material de demolição. A proposta dos arquitetos Lincoln Ferri Amaral e Paulo Pires Lima foi à recuperação histórica da arquitetura dos anos 40, preservando detalhes construtivos na fachada dos quatro lados do casarão.
As portas e janelas foram feitas com madeira de vagões desmanchados. Os dormentes dos trilhos da ferrovia serviram como batentes das portas e janelas, além emoldurarem uma das laterais da casa, servindo como moldura. O piso, formando caminhos da área interna para a externa destacou os dormentes de madeira, com o cuidado de manter a linguagem rústica do local. A passagem para a área externa anexa ao restaurante foi feita a partir da demolição do muro existente nos fundos da casa. O charme ficou por conta da retirada de parte dos tijolos, deixando o que sobrou com formato assimétrica. Os cacos e pedaços de tijolos quebrados foram reutilizados, formando mosaicos aparentes no piso. Até a calçada na lateral do prédio ganhou pedras (arenito) conseguidas no lixão da cidade.
Construção Sustentável
Esse tipo de obra caracteriza-se pelo uso de materiais e tecnologias biocompatíveis, que melhoram a condição de vida do morador ou, no mínimo, não agridem o meio ambiente em seu processo de obtenção e fabricação, nem durante a aplicação e em sua vida útil. É importante evitar materiais que reconhecidamente estão envolvidos com graves problemas ambientais, e sobre os quais hoje há consenso entre todas as entidades sérias que trabalham com Construção Sustentável e Bioconstrução no mundo, caso do PVC (policloreto de vinil) e o alumínio.
A Construção Sustentável é uma síntese das escolas, filosofias e abordagens que associam o edificar e o habitar à preocupação com preservação do meio ambiente e saúde dos seres vivos. A Construção Sustentável reúne conhecimentos de arquitetura, engenharia, paisagismo, saneamento, química, eletrônica, mas também de antropologia, medicina, sociologia, psicologia, filosofia e espiritualidade. Trabalhar para que um imóvel seja sustentável (e não ecológico, como erroneamente se fala) é de fundamental importância para a saúde do indivíduo e do planeta. (Rosane D´Andrea).
Tipos de Construção Sustentável
- Construídas com materiais sustentáveis industriais – Construções edificadas com ecoprodutos fabricados industrialmente, adquiridos prontos, com tecnologia em escala, atendendo as normas, legislação e demanda do mercado. É a mais viável para áreas de grande concentração urbana, porque se inserem dentro do modelo sócio-econômico vigente e porque o consumidor/cliente tem garantias claras, desde o início, do tipo de obra que estará recebendo. Raras vezes quem opta por este tipo de construção –clientes de médio e alto padrão- utiliza soluções artesanais ou caseiras.
• Construídas com resíduos não-reprocessados (Earthship), reuso de materiais de origem urbana, tais como garrafas PET, latas, cones de papel acartonado, etc. Comum em áreas urbanas ou em locais com despejo descontrolado de resíduos sólidos, principalmente onde a comunidade deve improvisar soluções para prover a si mesma a habitação. É também um modelo criativo de Autoconstrução, que ocorre muito nas periferias dos centros urbanos ou junto a profissionais com espírito criativo.
• Construídas com materiais de reuso (demolição ou segunda mão). Esse tipo de construção incorpora produtos convencionais e prolonga sua vida útil, e requer pesquisa de locais para compra de materiais, o que reduz seu alcance e reprodutibilidade. Este sistema construtivo emprega, em geral, materiais convencionais fora de mercado. É um híbrido entre os métodos de Autoconstrução e a construção com materiais fabricados em escala, sendo que estes não são sustentáveis em sua produção.
• Construção alternativa. Utiliza materiais convencionais, encontrados no mercado, conferindo-lhes funções diferentes das originais. É um dos modelos principais no seio das comunidades carentes. Exemplo: aquecedor solar que utiliza peças de forro de PVC como painel para aquecimento de água e caixa d’água comum como boiler. Sistema de Autoconstrução que se assemelha muito ao Earthship.
• Construções naturais. Faz uso de materiais naturais disponíveis no local da obra ou adjacências (terra, madeira, bambu, etc.), utilizando tecnologias sustentáveis de baixo custo e dispêndio energético. Exs.: tratamento de efluentes por plantas aquáticas, energia eólica por moinho de vento, bombeamento de água por carneiro hidráulico, blocos de adobe ou terra-palha, design solar passivo. Método construtivo adequado principalmente para áreas rurais ou quando se dispõe de áreas que permitam boa integração com elemento vegetal, nas quais haja pouca dependência das habitações vizinhas e dos fornecimentos (água, luz, esgoto) pelo Poder Público. Sistema que se insere nos princípios da Autoconstrução.
Entulho: o que pode ser reaproveitado?
Praticamente todas as atividades desenvolvidas no setor da construção civil são geradoras de entulho. No processo construtivo, o alto e polêmico índice de perdas do setor é a principal causa do entulho gerado. Embora nem toda perda se transforme efetivamente em resíduo, pois uma parte acaba ficando na própria obra, os índices médios de perdas fornecem uma noção clara do quanto se desperdiça em materiais de construção. Considerando que o entulho gerado corresponde, em média, a cerca de 50% do material desperdiçado, pode se ter uma idéia da porcentagem de entulho produzido em função do material que entra na obra.
Já nas obras de reformas a falta de uma cultura de reutilização e reciclagem e o desconhecimento da potencialidade do entulho reciclado como material de construção pelo meio técnico do setor, são as principais causas do entulho gerado nestas etapas, portanto, não relacionadas ao desperdício mas a não reutilização do material.
Nas obras de demolição propriamente ditas, a quantidade de resíduo gerado não depende diretamente dos processos empregados ou da qualidade do setor, pois o entulho produzido faz parte do processo de demolição. No entanto, indiretamente, a tecnologia e os processos construtivos utilizados na obra demolida, e o sistema de demolição utilizado, influem na qualidade do resíduo gerado, ou seja, alguns sistemas construtivos e de demolição podem produzir resíduos com maior potencial para reciclagem que outros, onde a mistura de materiais e componentes, ou sua contaminação, podem favorecer ou não a reutilização e a reciclagem do resíduo. (Rosane D´Andrea).